segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Avaliação do XXIX Encontro Nacional de Estudantes de Pedagogia

XXIX Encontro Nacional de Estudantes de Pedagogia
Universidade Federal de Pernambuco
Avaliação do Coletivo Marxista

Reorganizar o Movimento Estudantil de Pedagogia
a partir das Lutas



Entre os dias 19 e 25 de julho, cerca de 1.300 estudantes de Pedagogia estiveram reunidos na Universidade Federal de Pernambuco para participar do XXIX ENEPe, cujo tema foi “Educação e Periferias: disciplinamento, controle e resistências”. Desde 2007, o Coletivo Marxista participa do Movimento Estudantil de Pedagogia, estando presente no Fórum Nacional de Entidades de Pedagogia (FoNEPe-USP), no XXVIII ENEPe (UFES) bem como mobilizando lutas no dia-a-dia das Universidades e atuando nos Centros Acadêmicos. Um balanço comprometido com a reorganização que aponte as perspectivas para os próximos meses é extremamente necessário.

Da construção política do ENEPe


O método utilizado para as escolhas acerca do tema, programação, palestrantes e estrutura, destina à sede do evento todo o poder de decisão e precisa ser revisto. Com a desarticulação organizativa e estrutural da Executiva Nacional de Estudantes de Pedagogia (ExNEPe) nos últimos meses, ficou limitada a contribuição de diversos Centros e Diretórios Acadêmicos para a construção política do ENEPe, na qual deveria estar congregada a pluralidade de opiniões daqueles e daquelas que têm organizado as lutas em suas instituições e a tarefa de dialogar com o corpo discente presente no espaço a partir da realidade concreta de nosso cotidiano. O objetivo do Encontro deve apontar para o amadurecimento das discussões políticas e auxiliar nos debates que apresentem as perspectivas de mobilizações, lutas, posições políticas e atividades da ExNEPe, cujo espaço de deliberação é a Plenária Final. Nesse quesito, o eixo temático, a grade da programação e a escolha dos palestrantes desencadearam mais retrocessos do que avanços, que culminaram com nossa posição apresentada de, por exemplo, acertadamente unificar as mesas antes fragmentadas de Educação Básica e Ensino Superior.

Diante dessa avaliação, é necessário que o Movimento Estudantil de Pedagogia (MEPe) possa reavaliar o método atual e elaborar um Fórum decisório que congregue CAs, DAs e Executivas Nacional e Estaduais com direito a voz e voto para construir os seus espaços nacionais.

Outro debate importante nesse tópico é um vício que precisamos superar: o privilégio de mesas com palestrantes em detrimento de espaços como grupos de discussão. Defendemos a existência de espaços gerais onde palestrantes possam contribuir politicamente com os debates que precisamos travar; porém acreditamos que devamos intermediar tais espaços com discussões em pequenos grupos, onde mais estudantes possam se pronunciar, questionar, criticar e levantar propostas que visem o fortalecimento do Movimento Estudantil. Até mesmo porque deve ser através desses grupos que as propostas direcionadas à Plenária Final sejam apresentadas, discutidas e encaminhadas.

Para finalizar, duas outras questões devem ser refletidas. É interessante que a programação do evento não fique inchada de atividades e que haja nos eventos espaços livres para possibilitar que as delegações se reúnam e avaliem sua participação, que os campos políticos e movimentos possam apresentar suas contribuições ao MEPe, bem como espaços formalmente apresentados na programação para: (a) reunir os Centros e Diretórios Acadêmicos e as Executivas para discussões políticas e auxílio no bom andamento organizativo; e (b) articulações regionais para organizar os Estados e seus respectivos encontros e atividades.


Do turismo ao machismo, passando pela despolitização. Para além da culpabilização ou da naturalização, optar pela reorganização.


Devemos ser científicos ao analisar a totalidade dos problemas ocorridos no XXIX ENEPe. Em vez de naturalizarmos tais fatos ou culpabilizarmos bodes expiatórios, precisamos apontar alternativas que superem a atual despolitização e caminhem firmemente junto ao processo de reorganização da juventude brasileira.

É válido lembrar que nosso país passou por um processo de lutas pela redemocratização na década de 1980 após anos sob a ditadura empresarial-militar. Após esse período, o primeiro presidente, entretanto, é o mesmo que hoje se encontra envolvido na crise do Senado (José Sarney). Seu sucessor, Fernando Collor, inicia o processo de implementação do modelo neoliberal para favorecer os interesses dos setores dominantes e do imperialismo, intensificado pelo tucano Fernando Henrique Cardoso e atualmente pelo petista Lula. Além de precarizar as políticas públicas para Educação, Saúde e Segurança, o neoliberalismo incentiva a busca individual pela superação dos problemas, exacerba o umbiguismo e visa propagandear a vitória final do capitalismo.

Junto a tudo isso, a juventude, geralmente mais contestadora e com mais energia para as lutas, é embriagada. Por meio de novelas, músicas opressoras, reality shows, um convite à naturalização da divisão da sociedade em opressores e oprimidos está ao nosso alcance a cada hora, a cada minuto. Não bastasse essa realidade, a maior e mais representativa entidade estudantil de outrora – a União Nacional dos Estudantes (UNE) – inicia seu processo de burocratização, aparelhamento e afastamento das lutas. Desde 1991, a União da Juventude Socialista (UJS), ligada ao PCdoB, garante através de fraudes, manobras e malabarismos a sua hegemonia político-burocrática à frente da UNE, direcionando o auge de seus Congressos para festas e shows com artistas famosos, ao passo que os espaços de discussão política são cada vez mais sucumbidos ou diluídos atualmente em palco para presidente, senadores, deputados ou reitores. Ou seja, nossa principal referência de lutas e politização há um tempo se encontra a serviço do Governo Lula e das Reitorias que implementam projetos como a Reforma Universitária, o REUNI e o “novo” ENEM, atacando a educação pública. Se está ao lado de um Governo que garante milionários lucros para banqueiros, latifundiários e empresários, a UNE está contra a classe trabalhadora e contra a juventude aguerrida, que a partir de 2007 vivencia um processo de retomada das lutas, ocupando reitorias, construindo campanhas, passeatas e greves para defender a educação pública das garras desses que pretendem consolidar a educação enquanto mercadoria!

A partir desse quadro, precisamos identificar problemas e equívocos difundidos no XXIX ENEPe.

(1) Distribuir preservativos entre os materiais da inscrição é uma prática acertada. A liberdade de se relacionar homo e/ou heterossexualmente deve ser preservada e devem ser prevenidas a gravidez indesejada e o contágio de doenças sexualmente transmissíveis. Um guia turístico que apresente a história, a cultura, as tradições de luta existentes na cidade também é interessante, mas deve ser realizada uma política de passeios a esses espaços que não onere a participação nas atividades do evento, o que infelizmente ocorreu com o turismo exacerbado em Recife. É preciso sim criticar a inexistência de blocos e canetas para anotações de questões importantes que foram debatidas no evento, troca de contatos entre os estudantes etc. Como propostas, ficam a confecção de blocos e canetas com a logo ou o nome da própria ExNEPe, o que cria uma identificação com a entidade. Além disso, a ExNEPe deve incluir no panfleto com a programação os nomes dos palestrantes, de onde eles vêm mas principalmente formular cadernos de resumos dos principais debates temáticos.

(2) Tivemos inúmeros problemas com a alimentação. Primeiramente, devemos refletir: por que a UFPE não possui um Bandejão, o Restaurante Universitário? A política de assistência estudantil é limitada e isso deve estar na pauta de nossas lutas. A existência de Bandejões, com funcionários concursados, facilitaria a negociação, baratearia os custos e melhoraria a qualidade da alimentação e do atendimento. Infelizmente, no ENEPe, é preciso reconhecer que houve falhas gravíssimas na relação entre a Comissão Organizadora e a empresa responsável pela alimentação. Ter os estudantes bem alimentados ao longo do evento é essencial para a qualidade da participação. Um sério processo contra a empresa deve ser realizado e não aceitarmos silenciosamente que houve dias sem leite no café da manhã e estudantes almoçando cachorro-quente!

(3) Valores das Inscrições. O Movimento Estudantil deve se auto-financiar e estimular que as inscrições se voltem tanto para a garantia da estrutura do evento como da materialização da gestão da ExNEPe. Os CAs, DAs e Executivas Estaduais devem pensar a autonomia financeira, organizando rifas, pedágios, festas para arrecadar recursos bem como exigir o apoio de transporte das instituições. Porém, a Comissão Organizadora precisa ter flexibilidade e entender a realidade diversa existente em nosso país. A dívida oriunda de encontros anteriores precisa ser sanada realmente, mas também não podemos abrir mão da qualidade do evento em nome da mesma (como por exemplo na dificuldade declarada em levar palestrantes de estados distantes por conta dos gastos financeiros) e na inexistência de materiais para anotações no kit de inscrição!

(4) Durante o evento, o protagonismo de setores de luta possibilitou a reorganização do evento, criando as Comissões de Alimentação, Limpeza e Comunicação. O auxílio e a incorporação à Comissão Organizadora devem fazer parte da programação do evento (por meio de reunião entre Executivas, Centros e Diretórios Acadêmicos), acrescentando uma Comissão de Disciplina, que tenha uma política para acordar de maneira lúdica e tranqüila os participantes e também mobilizar para a participação nos espaços do evento; uma Comissão de Alojamento, que deve prezar pelo silêncio entre 23h e 07h para o descanso dos participantes; e uma Comissão Cultural, que formule as atividades noturnas para entreter e integrar.

(5) Atividades culturais devem ser espaços para integrar, entreter, sem prejudicar o andamento do evento. Ou seja, precisa ser pensado um teto de término e principalmente não pode se voltar a uma festa alienada, opressora e acrítica. É preciso sim reconhecer o equívoco do leilão de homens durante a Malicious Party, criticar qualquer prática de opressão ocorrida, seja machista, homofóbica ou racista (e não naturalizá-la como alguns estudantes fizeram, argumentando que são corriqueiras tais práticas) e refletir para estabelecer uma superação, uma transformação nas nossas relações culturais alinhadas às necessárias transformações sociais. Tais discussões podem e devem se interligar aos eixos temáticos de nossos encontros e inserir-se em nossas lutas!

(6) Poderíamos argumentar que a chuva atrapalhou, mas seria uma análise simplista. A não ocorrência de um Ato Público e de uma construção coletiva do eixo temático do mesmo é o reflexo do esvaziamento político e da pouca participação. É imprescindível que sejam realizados Encontros Estaduais nos próximos meses bem como o fortalecimento de pré-ENEPEs organizados pelos CAs, DAs e Executivas. No ENEPe foram aprovadas apenas as Executivas Estaduais de Minas Gerais e do Ceará, demonstrando nossa desarticulação.

(7) Um dia antes da Plenária Final, havíamos proposto que fossem digitadas e fotocopiadas todas as propostas apresentadas nos Grupos de Discussão Temática, que deveriam ser distribuídas para facilitar a leitura, acompanhamento e intervenções dos participantes com destaques e contribuições. Infelizmente, a Comissão Organizadora não acatou nossa proposta, informando que não seria necessário, pois haveria datashow para exibição das mesmas. Devido aos problemas relacionados ao datashow, a Plenária Final sofreu um atraso de quase quatro horas, impossibilitando a participação de diversas delegações que tiveram de partir após o horário do almoço, prejudicando dessa maneira a possibilidade de decisão sobre os posicionamentos da Executiva e também das sedes do FoNEPe e do ENEPe. Não bastasse o atraso e também a incerteza da hora em que a Plenária Final se iniciaria, a inexperiente condução da mesa estava extremamente confusa, ocasionando atitudes autoritárias e dificuldades de compreensão dos participantes.

(8) As candidaturas de Itaberaba e Brasília para sediar o próximo ENEPe bem como de João Pessoa e Belo Horizonte para o FoNEPe careceram de fundamentação política, estrutural e organizativa. O MEPe precisa amadurecer a ponto de que projetos de candidatura sejam construídos ao longo da gestão da ExNEPe, indicando entidades que apóiam, integrantes que já se comprometem com a Comissão Organizadora, fotos das condições para alojamento, alimentação e locais das atividades etc. e apresentados na Plenária Final para apreciação e posterior deliberação dos estudantes de Pedagogia. Voltamos a ressaltar a importância de que o eixo temático, programação e palestrantes sejam discutidos coletivamente em fórum com participação da ExNEPe, Executivas Estaduais, Centros e Diretórios Acadêmicos. Tanto a proposta de “Educação e Militância” como a “Políticas Públicas para a Educação Básica” foram lançadas de maneira solta, com limitadas fundamentações teóricas. A equivocada prática de levar as pessoas para votar nas sedes e esvaziar a plenária durante o espaço de discussão dos posicionamentos políticos e plano de lutas novamente foi constatada. Mais de duzentos estudantes participaram da escolha da sede do ENEPe, enquanto menos de oitenta acompanharam os debates políticos de conjuntura, Movimento Estudantil, Educação, Opressões etc. É válido ressaltar que mais de mil e trezentos estavam inscritos no ENEPe.

(9) Várias discussões esvaziadas e picuinhas pessoais através de denuncismos e descaracterizações políticas têm acompanhado os últimos anos do MEPe. No nosso entendimento, tais práticas não colaboram para o avanço das lutas e da reorganização e prejudicam a renovação dos quadros políticos ao confundir deliberadamente e afastar novos estudantes que iniciam sua participação.

(10) Para não dizer que não falamos das flores. A participação do Coletivo Marxista propiciou no Grupo de Discussão Temática o debate sobre temáticas extremamente pertinentes no atual cenário nacional, tanto que a maioria das resoluções apresentadas e (muitas) aprovadas na Plenária Final referentes à conjuntura, à Educação e à reorganização do Movimento Estudantil foram levantadas pela nossa militância. Apesar do esvaziamento quantitativo da Plenária, a qualidade das discussões a partir das defesas e contrariedades às propostas esteve presente. Eis abaixo o que apresentamos:

- Contra o Governo capitalista e neoliberal de Lula/PT (aprovada por consenso);
- Não às demissões e reduções de salários e direitos. Os trabalhadores não pagarão pela crise (aprovada por consenso);
- Pela construção de uma resposta política classista e anti-governista à crise do capitalismo (aprovada por consenso);
- Não à utilização do dinheiro público para salvar empresários e banqueiros (aprovada por consenso);
- Pela retirada das tropas militares brasileiras do Haiti (aprovada por contraste visual);
- Não à Reforma Universitária neoliberal de Lula/PT e revogação dos pontos já aprovados, como Programa Universidade Para Todos, SINAES/ENADE; Decreto das Fundações etc. (aprovada);
- Contra o Plano de Desenvolvimento da Educação do Ministro Fernando Haddad (aprovada por consenso);
- Pela revogação dos Decretos 6095/07 e 6096/07 (IFET e REUNI) e em defesa de uma expansão de qualidade (aprovada por consenso);
- 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a Educação! (aprovada por consenso);
- Por uma Universidade pública, gratuita, laica e a serviço do proletariado (aprovada adicionando “de ensino presencial”);
- Pelo livre acesso às Universidades e pelo fim do vestibular. Contra o novo ENEM (aprovada);
- Pela redução das mensalidades nas instituições privadas e pela estatização das mesmas (aprovada, fragmentando-se em duas diferentes);
- Em defesa do Passe livre no sistema de transportes (aprovada com modificações);
- Em defesa da Assistência Estudantil de Qualidade: creches, bandejões, alojamentos e bolsas! (aprovada por consenso);
- Contra a restrição do direito à meia-entrada e contra a volta do monopólio das carteirinhas pela UNE (aprovada por consenso);
- Aprofundar o processo de reorganização do Movimento Estudantil e avançar na construção de uma nova entidade estudantil pela base a partir da ruptura com a UNE. Ter uma posição de autonomia em relação à ANEL, não se comprometendo com sua política. (rejeitada);
- Posição de repúdio à Reitoria da UFPE pela ausência de apoio político à realização do ENEPe (aprovada).

Foram posicionamentos importantíssimos que situam a ExNEPe ao lado da classe trabalhadora, defendendo a Educação Pública, ratificando-a no campo da esquerda ao opor-se ao Governo de Lula/PT e a permanência do não reconhecimento da UNE enquanto entidade representativa dos estudantes.


Essa avaliação tem como objetivo estimular as melhorias para o Movimento Estudantil de Pedagogia. O combate ao turismo exacerbado, à despolitização, às opressões deve ser prática constante da militância. Não resolveremos tais problemas por meio de punições como expulsão do evento tampouco com o critério de carimbar crachás para ver quem terá 75% de participação nas atividades.

É aí que se encontra nosso maior desafio. A juventude brasileira precisa de novas referências, de novas concepções, de novas perspectivas. Como acreditamos que o novo sempre vem, a superação do velho passa por derrotar os agentes de um sistema opressor, cruel e desigual em que vivemos. Hoje, é preciso lutarmos contra o Governo Lula/PT e também contra seus braços entre os jovens: a União Nacional dos Estudantes. Portanto, urge que fortaleçamos a participação coletiva e reconheçamos o papel que possuímos enquanto vanguarda, atuando nos Centros e Diretórios Acadêmicos, Diretórios Centrais de Estudantes e também na própria Executiva de Estudantes de Pedagogia. A reorganização do Movimento Estudantil de Pedagogia deve caminhar lado a lado com a reorganização do Movimento Estudantil Geral. Defendemos que seja aprofundado o processo de reorganização e que avancemos para construir uma nova entidade estudantil pela base e a partir do marco político de ruptura com a União Nacional dos Estudantes.


Sejamos realistas. Exijamos o impossível!” (Maio de 1968).
Brasil, 10 de agosto de 2009.
COLETIVO MARXISTA

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