domingo, 8 de março de 2015

8 de março é dia de luta!




Angela Davis



Por Julia Leite, estudante, feminista e militante
do Coletivo Marxista

É chegado o 8 de março de 2015. O Dia Internacional de Luta das Mulheres, tão importante e simbólico, pode servir de referência para um balanço recente de nossas lutas. Perguntamos: o quanto nossa condição avançou do 8 de março de 2014 para cá? Mesmo entendendo que emancipação das mulheres estará necessariamente associada a transformações estruturais e, por isso, não acontecerá de uma hora para outra, é duro perceber que mesmo em nossas demandas mais imediatas nada avançamos. Nossas reivindicações continuam a ser urgentes e nossos direitos seguem sendo sistematicamente atacados. Na atual conjuntura isso se agrava: a crise capitalista se aprofunda, seus efeitos são cada vez mais sentidos no Brasil e o governo Dilma segue atendendo aos interesses dos setores sempre privilegiados na sociedade. A conta da crise, mais uma vez, está sendo paga pelos trabalhadores, com a retirada de direitos trabalhistas para operar o ‘ajuste’ e a ameaça crescente de desemprego.

Nossa vida e nossas pautas

O questionamento que fica é: o quão vulneráveis se encontram as mulheres trabalhadoras nessa situação? Certamente, serão as mais atingidas pela retirada de direitos, sobretudo as mulheres negras que seguem sendo o setor mais oprimido e vulnerável. Pensemos, por exemplo, nas recentes medidas provisórias aprovadas por Dilma, que restringem o acesso de milhões de trabalhadores ao seguro desemprego, ao auxílio doença e a pensão por morte. Sabendo que são as mulheres a ocupar os postos de trabalho mais precários, com maior rotatividade, mais casos de adoecimento e, também, que são majoritariamente ainda as mulheres responsabilizadas pelo trabalho doméstico, não é difícil perceber que essa retirada de direitos nos atingirá mais duramente.

Além disso, é crescente o ataque aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Seguimos contando corpos de mulheres trabalhadoras mortas em abortos clandestinos. São milhares de Jandiras e Elisângelas, entregues à violência e criminalização, em um país em que 850 mil mulheres abortam por ano e em que, a cada dois dias, uma delas morre em consequência de procedimentos inseguros. O avanço do fundamentalismo religioso e do conservadorismo no país tem nos custado não apenas o atraso na conquista do aborto legal e seguro, mas também o aumento da perseguição e criminalização, como mostram as recentes prisões e denúncias a mulheres que buscam serviços de saúde em situações de extrema fragilidade.

A violência contra mulheres segue sendo alarmante: no Brasil, a cada dois minutos, cinco mulheres são espancadas e os casos de homicídio contra mulheres colocam o país na sétima posição desse tipo de crime no mundo. Mulheres transexuais continuam sendo diariamente violentadas, assassinadas, marginalizadas do mercado de trabalho e dos serviços de saúde. Mulheres negras nas periferias de todo o país são assassinadas por um Estado cada vez mais militarizado e que criminaliza a pobreza. São, também, milhares de Cláudias mortas todos os anos pelo genocídio que se apresenta como política de segurança. E o direito a uma existência livre de violência, opressão, desigualdade e com liberdade sexual segue muito distante de todas nós. 

Organizar a luta das mulheres

A organização das mulheres para enfrentar tudo isso precisa avançar. Levando em conta o que tem sido o Dia Internacional de Luta da Mulher nos últimos anos, podemos tirar algumas conclusões. A primeira é que, entre a esquerda, ainda atuamos de maneira insuficiente para fazer o debate sobre o sentido da opressão à mulher e sobre o caráter histórico de luta do dia 8 de março. Há, sempre, importantes iniciativas, mas que ainda ficam a margem e são tratadas como algo secundário, enquanto o mercado se apropria da data e esvazia seu sentido. Em segundo lugar, a fragmentação da esquerda vem fazendo com que a cada ano, especialmente aqui no Rio de Janeiro, aconteçam mais atos isolados, sem representatividade e orientados apenas à autoconstrução das correntes que os impulsionam. Os setores comprometidos com a sustentação e defesa do governo Dilma, que continua retirando direitos e se colocando contra nossas demandas, tentam a todo curso blindá-lo e esvaziar as pautas politicamente, enquanto os setores do campo de oposição de esquerda ao governo permanecem fragmentados e sem conseguir avançar em sua reorganização.

Hoje, mais do que nunca, é importante destacarmos as conquistas que tivemos e falarmos também de tudo o que ainda falta ser conquistado. É importante ainda lembrarmos que, mesmo quando há conquistas para a mulher na sociedade capitalista, não existe plenitude. Uma sociedade erguida sobre a desigualdade nunca nos proporcionará igualdade. Talvez o melhor exemplo disso seja a entrada da mulher no mercado de trabalho: ao mesmo tempo em que foi um marco para nossa independência, foi uma estratégia precisa para que a exploração se materialize e aprofunde sobre uma mão-de-obra inicialmente “não qualificada” e ainda hoje, independentemente da qualificação, mais barata.

Deve estar claro para nós que a emancipação da mulher e da classe trabalhadora precisa romper com as estruturas do sistema capitalista. E não é por isso que deixaremos de reivindicar melhorias e direitos que gerem transformações vitoriosas para nós. Pelo contrário: a luta das mulheres é parte indispensável da transformação da sociedade, imprescindível para construir a sociedade que queremos, socialista, livre de opressão e exploração, e para formar sujeitos que atuem para essa transformação. Uma luta que deve ser protagonizada por mulheres e ter como aliados homens trabalhadores com quem nos irmanamos na luta contra o capitalismo.

Queremos saudar as mulheres que levam  duplas e triplas jornadas de trabalho, e que além de tudo sofrem com o preconceito, a violência e foram alijadas das universidades e dos espaços acadêmicos. A esquerda precisa resgatar o dia 8 de março como um instrumento de luta contra a opressão da mulher e em defesa de nossas pautas históricas. E, a partir da reconstrução desse debate, fazer com que cada vez mais mulheres se reconheçam como lutadoras capazes de construir o movimento e a garantir conquistas.  

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